Burnout e boreout: vale a pena pensar nisto!
Mais ou menos movimentados, nos corredores das empresas escondem-se inimigos silenciosos que afetam milhões de colaboradores em todo o mundo: o burnout e o boreout. São as duas faces de uma moeda, síndromes ligadas ao trabalho, que desgastam a mente e o corpo dos profissionais e que minam a saúde mental e a qualidade de vida.
Imagine-se num constante estado de exaustão, sentindo-se esgotado e sobrecarregado pelas demandas intermináveis do trabalho! Imagine-se a enfrentar um vazio emocional e uma falta de estímulo e de significado nas suas tarefas diárias! Ambos os cenários são mais do que simples desafios, são crises que podem desencadear problemas de saúde mental, que vão desde ansiedade, a stress e, até, a depressão profunda.
Este artigo aborda o impacto devastador do burnout e do boreout na saúde mental dos colaboradores, mas também como as pequenas e médias empresas (PME) podem desempenhar um papel crucial na prevenção e no combate dessas síndromes, enquanto abraçam os princípios do ESG – Ambiental, Social e Governança – para promover um ambiente de trabalho saudável e sustentável.
O conceito ESG tem vindo a tornar-se cada vez mais relevante no que ao mundo empresarial diz respeito. Esta sigla representa os critérios pelos quais as empresas são avaliadas em termos do seu impacto ambiental, práticas sociais e eficácia de governança corporativa.
Mas, dando destaque à componente social do ESG, que se relaciona com a atração e retenção de talentos, é de salientar que os colaboradores “de hoje” valorizam cada vez mais as empresas que demonstram preocupação com o bem-estar das equipas, com a diversidade e a inclusão no local de trabalho, assim como com o apoio a causas sociais. Ao priorizar essas questões, as PME cultivam uma cultura corporativa mais positiva e aliciante e atraem candidatos qualificados e motivados, essenciais para o crescimento e sucesso da empresa.
Saúde mental: trabalhadores portugueses apresentam maior risco
Posto isto, é claro que a saúde mental dos seus profissionais deve ser uma prioridade dentro das empresas, até porque Portugal já foi identificado como o país da União Europeia onde os trabalhadores estão em maior risco de burnout.
Em 2020, um estudo do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, do Instituto de Saúde Ambiental da Universidade de Lisboa e da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, revelou que um em cada quatro portugueses apresentava sintomas de stress crónico ligado ao trabalho. Porém, conforme um relatório, publicado em 2023 do Laboratório Português dos Ambientes de Trabalho Saudáveis, apenas um em cada cinco portugueses não nota sintomas de burnout, o que significa que 79,7% da população tem hoje, pelo menos, um sintoma de burnout.
Não existem estatísticas oficiais atualizadas sobre a percentagem de pessoas com boreout em Portugal, uma vez tratar-se de uma síndrome menos reconhecida e estudada. Contudo, não é menos real, logo é seguro afirmar que o boreout também pode ser um problema significativo em alguns ambientes laborais, especialmente em setores onde os profissionais podem enfrentar falta de desafios, tarefas monótonas ou subutilização das suas habilidades.
Burnout: “queimar até ao fim”
A síndrome de burnout é um estado de esgotamento físico, emocional e mental resultante de stress crónico relacionado com o trabalho. Caracteriza-se por sentimentos de desânimo, falta de motivação, frustração, irritabilidade, dificuldade de concentração e, muitas vezes, leva à redução da eficácia no local de trabalho e na vida pessoal.
Normalmente, o burnout é associado a profissões que envolvem um alto nível de exigência emocional e responsabilidade. Reconhecendo este sinal, é importante procurar ajuda profissional, de forma a evitar complicações mais graves para a saúde física e mental. A palavra burnout vem do inglês e significa “queimar até ao fim”.
O burnout é uma condição complexa e multifacetada, cujas causas podem variar de pessoa para pessoa, mas geralmente, estão relacionadas a fatores do ambiente laboral, mas também a características individuais. As causas comuns são: a carga de trabalho excessiva; a pressão e o stress crónico; a falta de controlo e autonomia; os conflitos interpessoais; a falta de alinhamento com os valores; a falta de reconhecimento e de recompensa; e o desequilíbrio entre vida pessoal e a profissional.
Alguns dos sintomas que uma pessoa em burnout pode sentir são os seguintes:
- Exaustão física e emocional: A pessoa sente-se constantemente cansada e esgotada, mesmo após períodos de descanso adequado.
- Despersonalização: Tendência a se distanciar emocionalmente das responsabilidades e das pessoas ao redor, manifestando cinismo, indiferença e até mesmo sarcasmo.
- Diminuição do desempenho: Dificuldade na realização de tarefas do dia a dia e no trabalho, com queda na produtividade e na eficiência.
- Frustração e irritabilidade: Sentimentos frequentes de irritação, impaciência e frustração, por vezes em situações que normalmente não seriam perturbadoras.
- Dificuldades de concentração: Incapacidade de foco em tarefas por períodos prolongados, com pensamentos dispersos e dificuldade em manter a atenção.
- Insónia ou distúrbios do sono: Dificuldade em adormecer, manter o sono ou acordar frequentemente durante a noite, mesmo quando está cansada.
- Alterações no apetite: Mudanças no padrão alimentar, como comer em excesso ou perder o apetite.
- Sentimentos de falta de realização pessoal: Sensação de incapacidade de alcançar metas pessoais ou profissionais e de que o trabalho não está a ser suficiente.
- Sinais físicos: Dores de cabeça, dores musculares, problemas gastrointestinais e outros sintomas físicos sem causa médica aparente.
Estes sintomas podem manifestar-se de forma gradual e tornar-se mais intensos ao longo do tempo, interferindo significativamente na qualidade de vida e no bem-estar. É importante procurar ajuda profissional para prevenir complicações graves, como a depressão, entre outros transtornos relacionados com o stress.
O tratamento do burnout envolve uma abordagem abrangente para ajudar os trabalhadores a lidar com o esgotamento físico, emocional e mental. Tratar o burnout implica melhorar as circunstâncias e condições que o originam, sendo, por isso, importante fazer uma revisão das condições de trabalho e das relações profissionais. Isto implica medidas como a redução da carga de trabalho e de gestão do stress; a promoção do equilíbrio entre vida pessoal e profissional; a oferta de programas de saúde mental e bem-estar por parte das empresas, como terapia e atividades de relaxamento; o estabelecimento de limites saudáveis, incluindo pausas regulares durante o dia de trabalho; a promoção de uma cultura de apoio e colaboração entre colegas e liderança; e o fornecimento de recursos de suporte e aconselhamento para ajudar os profissionais a lidar com os sintomas do burnout.
Estas estratégias visam restaurar o equilíbrio e a vitalidade dos indivíduos, prevenir a recorrência do burnout e promover um ambiente de trabalho saudável e sustentável. Mas, não é tudo! Consoante a sua gravidade, a síndrome de burnout exige também o acompanhamento por um ou mais profissionais de saúde, como por exemplo um psicoterapeuta ou um médico, uma vez que pode ser necessária a prescrição de medicamentos, sobretudo quando há depressão.
Boreout: “entediado”
Boreout é o termo usado para descrever um estado de tédio e de desinteresse no trabalho, devido à falta de desafios, responsabilidades significativas ou atividades estimulantes.
Contrariamente ao burnout, resultado de excesso de trabalho e stress, no caso do boreout, as pessoas sentem-se subutilizadas e insatisfeitas com suas tarefas, o que pode levar a sentimentos de apatia, desmotivação e, até mesmo, depressão. Ou seja, a síndrome de boreout está diretamente relacionada com o stress e a ansiedade profunda que a sensação de desvalorização pode causar ao colaborador. A palavra boreout vem termo inglês “bore out”, que em português pode significar aborrecer, ou “boring”, que quer dizer tédio.
Algumas das causas do boreout podem ser semelhantes às do burnout. No entanto, no caso desta síndrome estão, geralmente, relacionadas à falta de estímulos e oportunidades significativas. Algumas das causas incluem a falta de tarefas desafiadoras; a falta de autonomia e controlo; ausência de reconhecimento e recompensa; ambiente de trabalho desfavorável; e falta de alinhamento entre habilidades e tarefas.
Pode identificar-se casos em boreout, ao manifestarem os seguintes sintomas:
- Tédio e falta de interesse: Sentimento de desinteresse em relação às tarefas e responsabilidades no trabalho, levando a um estado geral de tédio e apatia.
- Falta de motivação: A pessoa tem dificuldade em sentir-se motivada ou entusiasmada com o trabalho, resultando em baixa produtividade e desempenho.
- Insatisfação: Os sentimentos de insatisfação e frustração derivam da falta de desafios ou oportunidades de crescimento.
- Fadiga mental: Sensação de cansaço mental e emocional, mesmo sem estar sobrecarregada de trabalho, devido à monotonia e falta de estímulo.
- Desânimo e baixa autoestima: A perceção de falta de valor ou importância resulta em sentimento de desânimo e baixa autoestima.
- Procrastinação: Tendência a adiar tarefas e responsabilidades devido à falta de interesse ou motivação para realizá-las.
- Sinais físicos: Em alguns casos, o boreout pode estar associado a sintomas físicos, como dores de cabeça, tensão muscular e problemas gastrointestinais, embora normalmente sejam menos proeminentes do que no burnout.
Estes sintomas podem manifestar-se gradualmente, ao longo do tempo, e afetar negativamente o bem-estar geral e a qualidade de vida do profissional. É importante reconhecê-los precocemente e procurar formas de abordar o tédio no local de trabalho. A síndrome pode ser causa de complicações graves de saúde mental, tais como a depressão e outros transtornos relacionados com o stress.
O tratamento do boreout é semelhante ao do burnout, sendo necessárias mudanças a nível laboral e apoio médico. Esta abordagem visa reintroduzir o interesse e a motivação. É necessário que a empresa aposte numa comunicação aberta para que os colaboradores expressem os seus sentimentos de tédio; que faça uma reavaliação das tarefas; que ofereça oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento profissional; que estabeleça metas claras e alinhadas com os interesses dos colaboradores; e que crie flexibilidade para equilibrar a vida pessoal e profissional.
Um ambiente de trabalho estimulante e gratificante é a chave, não apenas para o tratamento do boreout, mas também para a sua prevenção. Os colaboradores com esta síndrome devem procurar ajuda médica, uma vez que, nos casos mais graves, pode ser necessário fazer um tratamento com medicamentos, para tratar sintomas como ansiedade, depressão ou outros problemas de saúde mental que possam surgir.
A redução da produtividade é uma das principais preocupações, já que os colaboradores afetados por burnout ou boreout podem ter dificuldade em realizar as suas tarefas com eficiência e qualidade.
Burnout versus boreout: conclusão
A diferença entre as síndromes de burnout e boreaut é bem clara, o que facilita os gestores a identificar os problemas dos seus colaboradores. Como este artigo ilustra, a síndrome de burnout está relacionada com o trabalho excessivo e a exaustão causada pelo mesmo. Por outro lado, a síndrome de boreout está ligada à sensação de tédio e enfado. Embora diferentes, ambas podem desencadear sintomas semelhantes, como a ansiedade, depressão, irritabilidade, baixa autoestima, baixa produtividade, entre outros.
O impacto que estas síndromes podem ter nas nossas empresas é notavelmente semelhante, resultando em consequências negativas significativas. A redução da produtividade é uma das principais preocupações, já que os colaboradores afetados por burnout ou boreout podem ter dificuldade em realizar as suas tarefas com eficiência e qualidade.
Além disso, como foi referido acima, o aumento do absenteísmo e presenteísmo, os erros no trabalho e a baixa qualidade do desempenho também são sintomas comuns dessas síndromes, contribuindo para um ambiente de trabalho menos produtivo e eficaz.
A rotatividade de profissionais é outro problema, pois o esgotamento ou o tédio podem levá-los a procurar oportunidades em outras empresas, que ofereçam um ambiente mais estimulante e gratificante. Isto pode resultar em custos adicionais para as empresas, incluindo despesas com recrutamento, formação de novos colaboradores e perda de conhecimento e experiência.
O ambiente de trabalho tóxico gerado pelo burnout e pelo boreout pode afetar negativamente a coesão da equipa e a imagem geral da empresa.
Portanto, esteja atento/a aos sinais destas síndromes entre os colaboradores da sua PME e adote medidas proativas para promover um ambiente de trabalho saudável, desafiador e gratificante, que valorize o bem-estar e o empenho dos colaboradores.